O Ministério Público do Paraná expediu recomendação administrativa propondo ao Município de Curitiba uma série de adequações na norma local que regulamenta a legislação que institui, no território nacional, as normas gerais da Regularização Fundiária Urbana (Reurb) – a Lei Federal 13.465/2017. No entendimento da Promotoria de Justiça de Habitação e Urbanismo da Capital, unidade do MPPR que assina a medida, o Decreto Municipal 1.488/2022 está em desacordo com a legislação nacional, que define a política pública de regularização fundiária no país.Direito à moradia – A Regularização Fundiária Urbana (Reurb) é o conjunto de medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais, adotadas pelo Poder Público, voltadas à incorporação integral dos núcleos urbanos informais ao ordenamento territorial urbano, garantindo aos moradores não apenas a titularidade, mas também a infraestrutura urbana necessária para as condições de habitação e moradia. No documento, a Promotoria de Justiça ressalta que um dos principais objetivos da Reurb é a ampliação do acesso à terra urbanizada pela população de baixa renda, de modo a priorizar a permanência dos moradores nos próprios núcleos urbanos informais que, apesar de muitas vezes dotados de infraestrutura essencial e elevado grau de consolidação, não integram a cidade em si. Contudo, tal propósito não estaria sendo plenamente viabilizado pela atual legislação municipal, em contraste com os parâmetros mais flexíveis conferidos pela lei federal. O documento destaca o diagnóstico constante do Plano Setorial de Habitação e Regularização Fundiária do Município, o qual aponta como crescente o deficit habitacional da cidade na faixa da população de renda de zero a três salários-mínimos, o que representaria “mais de 83% do total no cadastro da COHAB-Curitiba”.Proposições – O envio da recomendação administrativa decorre de acompanhamento da Promotoria de Justiça sobre o tema. Para a discussão da temática, o Ministério Público contou com a colaboração de organizações da sociedade civil, como o Instituto Democracia Popular (IDP), que manifestaram preocupações quanto à norma local que regulamenta a Reurb. Entre as ações recomendadas, está a ampliação da participação da Comissão de Regularização de Loteamentos (CRL) no processamento dos requerimentos de regularização fundiária protocolados junto ao Município. A medida decorre da “competência exclusiva da Administração Pública Direta para a prática de atos decisórios no âmbito da Reurb, conforme previsão da norma geral” – explica o documento – dado que a CRL é composta por diversas secretarias municipais, integrantes da administração direta e indireta de Curitiba. Assim, a Promotoria de Justiça recomendou que todos os atos sejam submetidos à análise da CRL “com o fito de assegurar legitimidade, transparência, controle e participação da administração direta municipal em todas as etapas dos protocolos de Reurb”.
Outro item apontado como necessário, voltado a conferir imparcialidade às escolhas das áreas para regularização, é a definição e divulgação de critérios objetivos para determinar a ordem de prioridade na avaliação e na execução dos requerimentos de regularização fundiária, como, por exemplo, a priorização de áreas suscetíveis a risco de inundação.Compatibilização com a Lei Federal – Também foi recomendada a adequação das exigências documentais que são feitas atualmente pela norma local aos interessados como condição de processamento dos pedidos de regularização fundiária. A Promotoria de Justiça ressalta que, apesar de a documentação técnica estar presente no rol da Reurb, sua exigência enquanto requisito preliminar de admissibilidade dos requerimentos onera demasiadamente os cidadãos legitimados, limitando, potencialmente, a instauração de pedidos de Reurb. Nessa direção, a medida “não só carece de legalidade, como também de razoabilidade e proporcionalidade à luz das razões que justificaram a instituição de um novo regramento nacional sobre urbanização de favelas e de comunidades urbanas”, pondera o Ministério Público.
Além disso, a recomendação administrativa adverte que a exigência “(…) vulnerabilizaria ainda mais populações já empobrecidas que necessariamente deslocariam seus recursos de gastos com alimentação, saúde e educação para arcar com peças técnicas que são de responsabilidade da administração municipal. Ademais, transferir para famílias de baixa renda e, frequentemente, de baixa escolaridade, a contratação de empresas e profissionais para elaborarem peças técnicas complexas certamente resultaria em materiais que não correspondem às normas exigidas pela municipalidade”.
Encaminhada no último dia 5 de abril, a recomendação administrativa concede prazo de 30 dias para que o Município de Curitiba informe ao Ministério Público as providências adotadas para o acolhimento das proposições, sob pena da adoção das medidas judiciais cabíveis.
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Fonte: MPPR